quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Memórias Literárias


“Vento que sopra...
Vida que passa”
 Por Taís da Silva Martins
PROFESSORA: ÍDIA LÚCIA FERREIRA BENEVENUTO
Que saudades daquele tempo de criança!... Vida simples de gente da roça...
Tempo em que computador não era nem sonho. Que mundo sabido é esse? Tudo adiantado - segundo meu avô - era o arado passando, fazendo sulco na terra, meninos correndo e lançando sementes, a terra de cor escura e forte que cobria os grãos e sujava nossas roupas... A brincadeira da meninada era o adiantar do trabalho do pai roceiro.
Era o momento! Brincar na terra, depois pular corda... mais tarde, após o banho, vinham as bonecas e os boizinhos de sabugo, o sono pesado, carregado de sonhos.
Sonhava com, um dia, ir pra cidade, mudar da roça, não ter que varrer terreiros, não fazer vassouras de capim, nem recolher as folhas, nem ver mais aquelas árvores... o pé de laranja, o pé de jambo, o pé de manga... Ah! O pé de manga! carregado de mangas, só esperando subir, pegar, arrancar as cascas com os dentes, morder, ver o caldo suculento escorrendo... Até os braços tornavam-se doces, de tons amarelos, a língua passava da fruta à pele... saborosos momentos de boca suja... de risco de cair dali... de pegar mais que o irmão que já havia visto uma outra fruta , maior e mais bonita, no outro galho do outro lado do pé. Subir! Descarregar todas as mangas na minha boca.
Tudo isto está tão longe! A lembrança não é de ontem? Já pensou meu avô, aqui, hoje? O que seria o “adiantado”?
Lá de longe víamos o leiteiro, tocando o sininho, vinha buscar o leite, espumando frescor no balde que despejava o líquido branco na lata, o cheiro se misturava ao cheiro do curral, das vacas mansinhas, do bezerro novo, da cerca de tábua, da meninada que subia e descia, já tocando tudo para o pasto,
pegando o cavalo, correndo, galopando, ouvindo risadas e gritos “Vem pra cá, minino, cê cai desse bicho brabo!”
Fico imaginando meu avô cortando uma caixinha, tirando o leite. O que ele poderia dizer do cheiro, da falta da teta, das notícias na TV sobre os processos todos por que passa esse produto?
Eu me lembro da minha mãe lavando os lençóis na margem do rio. Minha mãe fazia mágica... ela mergulhava os lençóis sujos lá no fundo do rio, e... ABRACADABRA! Saíam lençóis brancos como algodão. Minha mãe os dependurava lá no fundo do quintal e eles mais pareciam nuvens brancas prontas para voar!
Um céu tão azul que eu não sabia. Uma serra tão verde que eu nunca havia percebido tantos tons diferentes que se misturavam. Nunca conseguimos colorido assim em nossos desenhos de escola.
Nem para apresentar ao avô, quando vinha nos ver na cidade.
A casa baixa, de janela de madeira, sempre abertas, mostravam o jardim sem canteiros separados, de onde minha avó colhia flores coloridas e grandes para levara Senhora do Rosário, lá na capelinha do povoado. E íamos todos, rosário na mão, orações tranquilas de muitas vozes.
Lá fora, na venda, os homens pediam a pinguinha, contavam casos, bebiam. Os meninos de calças curtas corriam atrás de qualquer coisa que rolasse na grama em frente à igrejinha.
Quem cortou meu pé de manga? Quem destruiu a cerca do tempo? Quem mudou os tons da vida?
Hoje, queria que tudo continuasse como viveu meu avô e se pudesse anularia os sonhos que tive quando criança. Cada sonho traz um sopro que balança nossos lençóis e traz novas realidades. O que sonhava na infância fez brotar meu sonho de adulta: voltar, nem que seja nos finais de semana e viver algo mais próximo da menina que hoje é mulher-mãe, e não tem tanta felicidade para oferecer aos que estão vindo.
Assim é a vida!... Vento que sopra... Vida que passa!
Texto baseado no depoimento de minha mãe: Aparecida Leocádia da Silva Martins.

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